Um ser que participa do Todo e tem saudade do tempo que não foi, mas sabe que um dia nele irá se desmanchar, e flutuar. Porquanto participo da sopa divina.
Voltando ao tema da arte. Nunca seria um crítico profissional por dois motivos.
O primeiro é que detestaria ficar lendo livros de que eu não gostasse. A minha grande alegria é poder ler apenas o que me dá prazer, abstendo-me da tarefa escrava de analisar, comparar, medir. Prefiro ler um livro, esquecer-me durante horas, gostar e pronto. Já o crítico não. Comporta-se como alguém que, depois de passar o dia inteiro comendo porcaria de boteco, vomita o que comeu para examinar o material. Em palavras mais macias: após passar o dia inteiro lendo rudimentos, já não tem mais saco para ler nada, nem mesmo aquilo que lhe apraz. Passado um tempo, já não sabe mais nem do que gosta. Identificamo-lo nas ruas pela tonalidade amarelada na face biliosa. O resultado final dessa tenebrosa rotina, se praticada por jovens, é o alcoolismo. Nos velhos, a cirrose.
Então o crítico nunca pode gostar do que lê?
Essa é a coisa mais estúpida que se pode pensar sobre um crítico, que ele gosta do que lê. Até hoje nunca li uma crítica elogiosa e boa, simultaneamente. A nota máxima de uma crítica confeiteira é a de corte: cinco. Já as críticas acabando com um livro ou filme ou seja lá que for, por outro lado, são as que prestam, é onde o crítico mostra seu talento. É onde deposita, em forma concentrada, como um animal venenoso, todo o ódio que acumulou do cozinheiro.
A segunda razão por que não me torno um crítico é que não tenho capacidade.