Um ser que participa do Todo e tem saudade do tempo que não foi, mas sabe que um dia nele irá se desmanchar, e flutuar. Porquanto participo da sopa divina.
Ontem fui numa festa numa REP chamada Ursa Maior. Open bar, doze reais para homem. Sete para as mulheres. A festa estava boa. As quatro da manhã, a casa inteira cheirava vômito. Uma menina gordinha, baixinha, bonitinha, de casaco preto, simplesmente tombou na nossa frente. Um amigo deu a mão para ela se levantasse, mas praticamente não adiantou. Eu que estava do lado também dei uma ajuda à garota, que não conseguia achar o cigarro no bolso da jaqueta.
Enquanto ela justificava a situação embaraçosa, dizendo que era a primeira vez na vida que ela ficava daquele jeito e tal, eu fui colocando o cigarro na boca dela. Acendi, e recomendei-lhe fumar o cigarro até o fim, seria a melhor coisa para melhorar da bebedeira. Percebi que ela confiava em mim. Deixamo-la em pé, escorada na parede para não cair, enquanto ela fumava o cigarro com uma cara de boa menina. Uns quinze minutos depois ela jogada no corredor, com uma poça de vômito do lado esquerdo, e algum de seus amigos sentado no lado direito, tentando cuidar dela.
Não entendi nada a hora em que cheguei na festa. E fui embora entendendo muito menos. Lembro-me de não sei quem que ficou falando para eu “enfiar o pinto”. Todas as conversas eram abreviadas, eram lapsos de conversa. A grande maioria dos diálogos não passava de clichês. Senti, nesta hora que Hume estava certa: o eu era um feixe de percepções, umas mais fracas outras mais fortes.
De qualquer forma o som estava bom. A banda tocava boa música. Coisas desde o inteligentíssimo Cazuza até Queen. Tive bons momentos quando tocou “Bichos escrotos” dos Titãs. Maior barato: “Bichos escrotos saiam dos esgotos, bichos escrotos venham enfeitar, meu lar, meu jantar, meu nobre paladar”, “Oncinha pintada, coelhinho peludo, vão se fuder”, “Ratos, saiam dos sapatos, dos cidadãos civilizados”.
É música é legal, numa festa como aquela caia bem. Mas devo dizer aqui que sou sim um cidadão civilizado. E mais: acho que é bom ser um cidadão civilizado. Gosto mesmo da civilização, de arquitetura, de filosofia oriental, de pintura, de teatro, de gastronomia. Pena que não é sempre que tenho cabeça para isso.